ESTEREOFONIA - DANIEL SENISE | MURILO SALLES | ||
COISAS QUE PRECISAM SER VISTAS EM LOOP Estereofonia são seis loops com três telas cada. Um trabalho sobre outro trabalho. Murilo Salles e Daniel Senise. Mediação entre duas formas diferentes de trabalhar a tela, como pintura e, outra, como imagem em movimento.Transitar com o pictórico de uma poética específica, justa, precisa, para outra que quer aderir a essa precisão. Um diálogo impossível. Estereofonia são todos os sentidos que emanam desse encontro. Procurar a simulação pelo que há de semelhança. Operação silenciosa, apesar de estéreofonica. Movimentos e camadas. Imagens que são retidas por um enquadramento que tenta perceber o que há por trás do pictórico. Um ensaio sobre um trabalho. Começamos com um loop com o nome geral Estereofonia. Uma mirada à direita, outra ao centro e a terceira, à esquerda. O ateliê. Pelo eixo central espacializamos uma realidade que quer aderir à obra. Em outro loop, Ateliê Queens, o mesmo movimento para interiorizar o espaço e o tempo na obra. Um veículo olha outro e, pretenciosamente tenta simbolizar semelhanças. As telas, janelas, a vista, percebidas pelo quadro. Um terceiro loop, Quase infinito, também circular, tenta dar conta da tensão entre História e sujeito, num espaço e no trajeto até o trabalho. A galeria. O retorno à figura, ou às figurinhas -em movimento- num grande loop dentro do loop: Beijo do elo perdido. Incorporar o nome, incorporar o local, incorporar o quarteirão da arte para corporificar uma imagem que já está lá dentro. Um outro, é o silencioso mas grosseiramente musical loop intitulado Pintura. O silêncio sobre a explicação. A imagem da persistência. Compulsão. Finalmente, o loop que poderia se chamar Diálogo, mas que intitula-se Ateliê Lapa. Tentar um contato mais sensorial, por inversões: o vazio da tela é violentado por espasmos do fazer da pintura. Atonal, dissincronizado, criando uma presença de algo que ainda não existe, o quadro. A pintura sudária de Daniel Senise é aplicada/retirada na/da tela preta (a tela inicial) de Murilo Salles. Todos esses loops precisam ser vistos simultâneamente. São necessários 18 monitores de vídeo sincronizados. Essa é a estereofonia que trabalhamos, uma grande tela para provocar experimentações/relações de sentidos. Essa é a idéia da coisa. Murilo Salles Maio 2005 Murilo Salles entitulou este vídeo de Estereofonia. Veja-o e/ou reveja-o este vídeo procurando construir relações possíveis entre o processo de trabalho de Senise e a "reconstituição da distribuição espacial das fontes" mostradas pelo diretor. Observe como vamos descobrindo mais aspectos da obra na medida em que vemos mais e mais imagens vindas de várias fontes. Observe como a opção por não ter som é intencional e fundamental para que o objetivo do projeto seja alcançado. Veja (e/ou reveja) também o vídeo "SERGIO CAMARGO - 1984" do mesmo diretor e observe as mudanças na linguagem que ocorrem com a distância no tempo - o vídeo sobre o Sergio foi realizado em 84 e este em 2005 - e como elas influem na abordagem da obra de dois artistas tão diferentes. O vídeo "SERGIO CAMARGO" é da primeira série de "documentários/documentos" sobre trabalhos de artistas plásticos. Nele, a questão e o desafio à época, era tentar transpor para a imagem em vídeo, com a imensa limitação desse suporte a 21 anos atrás, o impacto e a radical visualidade da obra de Sergio Camargo. Texto do Catálogo RIOARTE VÍDEO por Glória Ferreira A câmara, em sua conversa com o processo do artista, como que desliza sobre a pintura: percorre o ateliê, aproxima-se, distancia-se e insere múltiplos pontos de vista. As telas, suporte do cinema e do fazer pictórico, se associam, se entrelaçam, convocando diferentes questões que transpassam a história da pintura, e a poética de Daniel Senise: jogo das imagens dentro das imagens, ou de telas dentro de telas; citações, apropriações; procedimentos de sua “pintura sudária”, como diz o artista, com a arqueologia das camadas; a impureza, a materialidade do muro a invocar um sentido de memória, de vestígios de coisas; ou ainda, o lugar a partir de onde se vê a pintura, questão tão fundamental desde o Renascimento e que encontra na atual pintura as modalidades de apresentação como campo de ação – o que Estereofonia, ao criar uma singular relação entre movimento, espaço e tempo, requer como situação e escala. Em sua sinfonia sem som, com seis loops, o cineasta Murilo Salles evoca o permanente trabalho de reinvenção da própria pintura, processo ao qual a démarche de Daniel Senise faz parte desde os anos 80 e que o expressivo e silencioso movimento de suas mãos, no loop denominado Pintura, eloqüentemente enfatiza. |